Irretroatividade da Lei Penal. Retroatividade da lei mais benéfica. Interpretação da Lei Penal. Tempo do Crime.

1. Compreender a aplicação da lei penal no tempo;

2. Refletir sobre a irretroatividade da lei penal e seu papel garantidor;

3. Saber interpretar a lei penal.

A irretroatividade da lei penal significa que uma lei penal nova não pode retroagir para atingir fatos ocorridos antes de sua vigência, ou seja, não pode ser aplicada a crimes cometidos anteriormente à sua entrada em vigor.

Esse princípio está consagrado no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal do Brasil, que estabelece que "nenhuma pena será aplicada sem prévia cominação legal".

Ou seja, a lei penal deve ser clara e precisa, e as pessoas não podem ser punidas por algo que não era considerado crime na época em que o ato foi praticado.

No entanto, há exceções para a irretroatividade da lei penal, como nos casos em que a nova lei penal seja mais benéfica ao réu.

Nesses casos, é admitida a retroatividade da lei, o que é chamado de princípio da retroatividade benéfica ou princípio da legalidade penal favorável ao réu.

Exemplo de Irretroatividade da Lei Penal no Brasil:

Caso do Código Penal de 1940 e a mudança no tratamento de crimes sexuais em 2009:

Um exemplo claro de irretroatividade pode ser observado nas mudanças realizadas pela Lei 12.015/2009, que alterou a definição de crimes sexuais no Brasil. Antes dessa lei, o crime de estupro estava caracterizado apenas como a relação sexual forçada com a vítima, enquanto após a mudança, a legislação ampliou o conceito para incluir a constrangimento sexual (qualquer ato sexual sem consentimento da vítima, não necessariamente uma relação sexual).

Em um caso ocorrido em 2008, um acusado cometeu um ato de violência sexual, mas o crime não se enquadrava de acordo com a definição posterior de estupro (após 2009), que ampliou o alcance da punição. Contudo, a lei que entrou em vigor em 2009 não pode retroagir para modificar o entendimento sobre o caso ocorrido em 2008, já que a lei penal não pode ser aplicada de maneira retroativa. Ou seja, a nova lei não poderia alcançar o ato praticado em 2008, configurando a irretroatividade da lei penal.

Exemplo de Retroatividade da Lei Penal (Princípio da Retroatividade Benéfica) no Brasil:

Caso do "Pacote Anticrime" e a redução de penas:

Em 2019, o Pacote Anticrime introduziu mudanças significativas no direito penal brasileiro. Uma das alterações foi a mudança no regime de cumprimento de penas, permitindo que pessoas condenadas por crimes menos graves pudessem cumprir suas penas em regime aberto ou semiaberto em prazos menores.

Em um exemplo real, um detento que foi condenado a 10 anos de prisão por um crime, mas estava cumprindo a pena em regime fechado, pode pedir a revisão de sua pena e, caso tenha se enquadrado nas novas regras, pode ser beneficiado pela redução de tempo de cumprimento de pena, devido à retroatividade da lei penal benéfica. No caso, a lei passou a permitir que ele pudesse cumprir a pena em regime mais brando, reduzindo o tempo de detenção, o que se configura como uma retroatividade benéfica.

Esse tipo de mudança é permitida pela Constituição, pois a retroatividade benéfica favorece o réu, quando a nova norma é mais favorável a ele.


As consequências jurídico-penais condicionadas ao tempo referem-se a situações em que a aplicação de uma pena ou efeito jurídico depende do decorrer do tempo, ou seja, da temporalidade da infração ou da punição. No âmbito do Direito Penal, essa questão é tratada principalmente sob duas óticas: prescrição e decadência. Além disso, também podemos observar fenômenos relacionados à reabilitação e à progressão de regime.

1. Prescrição Penal

A prescrição é a perda do direito de punir do Estado após um determinado período de tempo, estabelecido em função da gravidade do crime e da pena cominada. A prescrição extingue a punibilidade do agente, ou seja, o Estado perde o direito de processá-lo e puni-lo após o transcurso de um prazo específico.

- Prescrição pela pena: O prazo para a prescrição varia conforme a pena máxima prevista para o crime. Por exemplo, crimes com pena de até 1 ano têm um prazo de prescrição mais curto do que crimes com penas superiores a 10 anos.

- Prescrição intercorrente: Também ocorre quando o processo fica paralisado por um período considerável, sem que haja andamento.

A prescrição pode ser interrompida por certos atos processuais, como a citação do réu, e sua contagem reinicia do zero após a interrupção.

Exemplo: Se uma pessoa comete um crime de furto com pena de até 1 ano, e o processo fica parado por mais de 5 anos sem movimentação, a prescrição pode ser alegada como causa de extinção da punibilidade.


2. Decadência

A decadência é a perda de um direito do titular após o transcurso de um determinado período de tempo. No âmbito penal, a decadência é relacionada a direitos subjetivos do acusado, como o direito de recorrer a determinados atos processuais em prazo específico.

A decadência está mais relacionada ao direito do ofendido, como ocorre em ações penais privadas (nos casos em que a vítima deve representar pela ação penal). Quando o ofendido não age dentro do prazo previsto, o direito de ajuizar a ação penal desaparece.

Exemplo: O crime de calúnia, no qual a ação penal é de iniciativa privada, exige que o ofendido apresente a queixa-crime dentro do prazo de 6 meses. Caso não o faça, ocorre a decadência do direito de ação.


3. Reabilitação Penal

A reabilitação é a conseqüência jurídica que ocorre após o cumprimento de pena, possibilitando que o condenado, após ter cumprido sua pena (principalmente pena privativa de liberdade), reabilite-se no exercício de certos direitos.

Com o tempo e o cumprimento integral da pena, o condenado pode pedir a reabilitação (ou remissão) e voltar a ter direitos que foram suspensos, como o direito de votar, de ocupar cargos públicos, entre outros. Para a concessão da reabilitação, é necessário demonstrar que o condenado se reabilitou socialmente.

Exemplo: Após o cumprimento da pena, um ex-presidiário pode pedir a reabilitação para voltar a exercer sua profissão, ou mesmo para recuperar a cidadania plena (inclusive o direito ao voto).


4. Progressão de Regime

A progressão de regime é uma consequência jurídica condicionada ao tempo de cumprimento da pena. O condenado pode passar de um regime mais severo (fechado) para um regime mais brando (semiaberto, aberto) após o cumprimento de uma parte da pena, se demonstrar bom comportamento.

Essa progressão está condicionada ao tempo e à avaliação do comportamento do preso ao longo do cumprimento da pena, sendo uma forma de estimular a reintegração social.

Exemplo: Uma pessoa condenada a 10 anos de prisão no regime fechado pode, após cumprir um período de 1/6 da pena (ou 1/4, dependendo do caso), solicitar progressão para o regime semiaberto, se demonstrar bom comportamento e aptidão para reintegração social.


5. Comutação da Pena

A comutação da pena é uma substituição de pena privativa de liberdade por uma mais branda (como a pena de prestação de serviços comunitários ou prisão domiciliar) e está condicionada ao tempo cumprido, ao comportamento do condenado e a outros fatores avaliados pela Justiça.

Exemplo: Um condenado que cumpriu parte de sua pena em regime fechado pode ser comutado para uma pena mais branda, como a prisão domiciliar, se demonstrar boa conduta durante o cumprimento da pena.


Resumo

As consequências jurídico-penais condicionadas ao tempo podem ser vistas em várias esferas do Direito Penal:

- Prescrição: Extinção da punibilidade com o passar do tempo.

- Decadência: Perda do direito de ação ou de representar no processo.

- Reabilitação: Recuperação de direitos após o cumprimento da pena.

- Progressão de Regime: Mudança para um regime mais brando com o tempo e boa conduta.

- Comutação de Pena: Substituição de pena mais severa por uma mais branda, dependendo do tempo cumprido e da avaliação da conduta do réu.

Esses mecanismos asseguram que, com o tempo, o réu possa ser reintegrado à sociedade ou, ao contrário, ter seu direito de punição extinto.


O conflito de leis penais no tempo ocorre quando uma infração é cometida em um período de tempo em que existam diferentes normas penais que podem ser aplicadas ao caso, ou seja, quando há mudança na legislação penal e surge a dúvida sobre qual lei deve ser aplicada ao fato criminoso: a lei vigente no momento do crime, a lei posterior, ou a lei mais benéfica ao réu.

Esse conflito é regido por princípios que buscam garantir justiça, e as regras fundamentais são: princípio da legalidade e princípio da irretroatividade da lei penal, bem como a aplicação da retroatividade benéfica em determinadas situações.

Princípios que Regem o Conflito de Leis Penais no Tempo

1. Princípio da Legalidade (ou da Anterioridade):

- De acordo com o art. 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal, "não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal".

- Esse princípio significa que ninguém pode ser punido por um ato que não estava previsto como crime na época em que foi praticado.

2. Princípio da Irretroatividade da Lei Penal:

- A lei penal não pode retroagir para prejudicar o réu. Ou seja, uma nova lei penal mais severa não pode ser aplicada aos crimes cometidos antes de sua vigência.

- Entretanto, a irretroatividade se aplica apenas no caso de uma lei mais severa. Se a nova lei for mais benéfica, ela pode retroagir e ser aplicada ao fato já cometido (princípio da retroatividade benéfica).

3. Princípio da Retroatividade Benéfica:

- Este princípio prevê que, se uma lei posterior for mais benéfica ao réu, ela poderá retroagir e ser aplicada aos crimes cometidos antes da sua vigência, mesmo que a infração tenha ocorrido sob a vigência de uma lei mais severa.

- Ou seja, a lei mais favorável ao réu pode ser retroativa, mesmo que o fato tenha ocorrido quando a norma anterior estava em vigor.

Classificação do Conflito de Leis Penais no Tempo

O conflito de leis penais no tempo pode ocorrer em três situações principais:

1. Lei Penal Posterior mais Benéfica (Princípio da Retroatividade Benéfica):

- Quando uma lei mais benéfica entra em vigor e o réu já foi condenado ou está sendo processado, essa nova lei pode ser aplicada ao caso, mesmo que o crime tenha sido cometido antes da mudança legislativa.

- Isso ocorre para garantir o direito do réu à melhor punição possível, ou seja, a punição mais branda.

Exemplo: Se antes da mudança legislativa, o crime de furto tinha uma pena de 5 a 10 anos de prisão, mas uma nova lei reduz a pena para 2 a 6 anos, o condenado por furto antes da mudança poderá pedir que a pena seja recalculada com base na nova lei, pois ela é mais benéfica.

2. Lei Penal Posterior mais Gravosa:

- Quando uma nova lei torna o crime mais severo, a regra geral é que a nova lei não pode retroagir, ou seja, não pode ser aplicada aos fatos cometidos antes de sua vigência.

- Isso é consagrado pelo princípio da irretroatividade da lei penal. A pessoa não pode ser punida por uma lei que não existia no momento da prática do ato.

Exemplo: Se, antes de uma alteração legislativa, o crime de homicídio era punido com uma pena de 6 a 12 anos e a nova lei aumenta a pena para 12 a 20 anos, a pessoa que cometeu o crime antes da alteração legislativa não pode ser punida com base na nova lei, porque ela não pode retroagir para agravar a situação do réu.

3. Lei Penal Intermediária:

- Quando uma lei é alterada, mas o crime já foi cometido e o réu já foi condenado ou o processo já se iniciou, a aplicação de uma nova lei pode depender de uma interpretação do juiz sobre qual lei deve prevalecer, em caso de mudanças significativas no ordenamento jurídico durante o período do fato e da condenação.

- Se entre a data do crime e a data da sentença houver uma mudança legislativa, a lei que será aplicada dependerá da análise de seu impacto no caso específico, respeitando o princípio da anterioridade da lei penal e a irretroatividade.

Exemplos de Conflito de Leis Penais no Tempo no Brasil

1. Exemplo de Retroatividade Benéfica:

- Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas): Antes dessa lei, a prática do tráfico de drogas tinha penas mais severas. Quando a Lei de Drogas foi sancionada, ela trouxe penas mais brandas para certos casos de tráfico. Aqueles que haviam sido condenados com base na legislação anterior, mais severa, poderiam pedir a retroatividade benéfica da nova lei, já que ela trazia penas mais favoráveis.

2. Exemplo de Irretroatividade de Lei Penal mais Gravosa:

- Lei 13.964/2019 (Pacote Anticrime): Essa lei trouxe modificações em diversas áreas do direito penal, incluindo o aumento das penas para crimes como homicídios qualificados. Contudo, a irretroatividade da lei impede que a pessoa que tenha cometido o crime antes da vigência dessa lei seja punida com base nas novas penas mais graves.

Considerações Finais

O conflito de leis penais no tempo é um tema essencial para garantir a justiça e os direitos fundamentais dos cidadãos. O princípio da legalidade e da irretroatividade busca assegurar que as pessoas não sejam punidas por algo que não era crime na época em que o ato foi cometido, ao passo que a retroatividade benéfica permite a aplicação de normas mais brandas para beneficiar o réu, mesmo quando o crime ocorreu sob uma legislação anterior.

Esse equilíbrio entre a aplicação das leis e os direitos dos réus é um dos pilares do direito penal, assegurando que as mudanças legislativas sejam justas e não prejudiquem os direitos fundamentais do indivíduo.


Concursos de crimes referem-se à situação em que uma pessoa comete mais de um crime em uma única conduta ou em diversas condutas interligadas, sendo que o direito penal brasileiro trata essas situações de forma específica, estabelecendo diferentes formas de concursos de crimes.

Existem três principais tipos de concursos de crimes no Direito Penal: concurso material, concurso formal e crime continuado.

1. Concurso Material de Crimes (Art. 69 do Código Penal)

O concurso material ocorre quando o agente pratica vários crimes de forma independente e isolada, ou seja, ele comete um crime após o outro, sem que um crime dependa diretamente do outro. Nesse caso, o réu será punido separadamente por cada crime, sendo aplicadas penas cumulativas para cada infração.

- Exemplo: Uma pessoa rouba um celular de alguém e, após isso, comete um furto em uma loja. Nesse caso, ela cometeu dois crimes de forma independente, e a pena será somada: uma pena por roubo e outra por furto.

2. Concurso Formal de Crimes (Art. 70 do Código Penal)

O concurso formal ocorre quando o agente, com uma única ação ou omissão, pratica vários crimes. Ou seja, a pessoa comete vários crimes em uma única conduta, sendo punida por eles, mas a pena será única, com uma aumento proporcional, dependendo da quantidade de crimes cometidos.

- Exemplo: Uma pessoa, em um único disparo de arma de fogo, mata duas pessoas. Nesse caso, embora tenha cometido dois homicídios, a pena será única, com aumento proporcional, ao invés de serem somadas as penas dos dois homicídios separadamente.

O concurso formal pode ser simples ou qualificado:

- Concurso formal simples: Quando o agente pratica crimes de forma independente, mas com um único ato.

- Concurso formal qualificado: Quando a conduta do agente causa um agravamento da pena. Por exemplo, quando o agente comete vários crimes de forma continuada ou quando existe uma intenção dolosa (por exemplo, a prática de homicídios em um único ato com intenção de exterminar várias pessoas).

3. Crime Continuado (Art. 71 do Código Penal)

O crime continuado ocorre quando o agente pratica, de forma reiterada, crimes da mesma espécie, com um único intuito criminoso e com um mesmo comportamento delitivo. Ou seja, há uma continuidade delitiva, onde o agente comete crimes semelhantes, mas é tratado como se fosse uma única infração, com pena mais branda.

- Exemplo: Uma pessoa que, por vários dias seguidos, furtou itens de diversas lojas. Apesar de ter praticado múltiplos furtos, a conduta é considerada como crime continuado (furto continuado) e será punida com uma pena mais branda, como se fosse um único furto, com aumento proporcional.

Para que se configure o crime continuado, é necessário que os crimes tenham características semelhantes (por exemplo, furtos ou homicídios) e que o agente tenha intenção única e uma mesma linha de conduta. O crime continuado tem como objetivo dar tratamento jurídico mais favorável ao réu, considerando que há uma única motivação para a prática dos crimes.


Distinções entre os Tipos de Concurso de Crimes:

| Tipo de Concurso | Número de Crimes | Pena | Exemplo |

|-------------------------|-----------------------------|------------------------|-------------------------------------------------|

| Concurso Material | Vários crimes independentes | Penas cumulativas | Uma pessoa comete um furto e depois um roubo. |

| Concurso Formal | Vários crimes em um único ato | Pena única, aumentada | Uma pessoa mata duas pessoas com um único disparo. |

| Crime Continuado | Vários crimes semelhantes | Pena única, com aumento proporcional | Pessoa furtando várias lojas com uma única intenção. |

Aplicação das Regras de Concurso de Crimes:

- Concurso material gera a soma das penas, ou seja, o réu será condenado separadamente por cada crime.

- Concurso formal gera uma única pena, mas com aumento proporcional de acordo com o número de crimes cometidos.

- Crime continuado resulta em uma pena única, mas com aumento em relação ao crime individual, sendo mais brando do que a soma das penas.


Exemplo Real de Concurso de Crimes no Brasil:

Um exemplo clássico de concurso material pode ser encontrado em casos de crimes cometidos em sequência, como um furto seguido de um roubo. Um réu que, ao cometer o furto, usa violência física para praticar o roubo imediatamente após, estará cometendo dois crimes (furto e roubo) e deverá ser punido separadamente por ambos.

Já o concurso formal pode ocorrer quando, em um único disparo de arma de fogo, uma pessoa mata duas vítimas. Nesse caso, a pena será única, mas aumentada em razão da quantidade de vítimas.

Por fim, um exemplo de crime continuado pode ocorrer quando um réu, ao longo de diversos dias, pratica furtos em várias lojas com a mesma intenção criminosa (subtrair bens). Embora tenha cometido vários crimes, eles serão tratados como uma única infração, com a pena mais branda.

Esses conceitos são fundamentais no direito penal para garantir que a pena seja proporcional à gravidade da conduta do réu, respeitando os princípios da justiça e da razoabilidade.


O princípio ou critério da especialidade é um conceito fundamental no direito penal, utilizado para resolver o conflito entre normas penais que regulam a mesma matéria, mas que têm um alcance ou uma definição diferente. Esse princípio se aplica quando existem duas ou mais leis penais que tratam do mesmo fato criminoso, mas uma delas é considerada mais específica e a outra mais genérica.

A lei especial derroga a lei geral: lex specialis derogat generali.

Definição

De acordo com o princípio da especialidade, quando há conflito de normas penais (ou seja, mais de uma lei aplicável ao mesmo fato), a norma mais específica prevalece sobre a norma mais genérica. Em outras palavras, a norma que trata de forma mais detalhada ou especializada uma conduta deve ser aplicada, em detrimento da norma geral, que possui uma aplicação mais ampla.

Este critério busca garantir que a aplicação da pena seja mais precisa e adequada à tipificação penal do comportamento do agente.

Como Funciona o Princípio da Especialidade

- Quando um fato pode ser enquadrado tanto em uma norma penal geral quanto em uma norma penal mais específica, a lei mais específica deve ser aplicada, já que ela reflete de maneira mais detalhada a gravidade da conduta e o bem jurídico tutelado.

- Exemplo: Se uma pessoa comete um crime de tráfico de drogas e também de associação criminosa, o tráfico de drogas está tipificado de forma mais específica no Código Penal (Lei 11.343/2006), enquanto a associação criminosa (art. 288 do Código Penal) é um crime mais genérico, tratando de qualquer forma de associação entre criminosos. Nesse caso, o princípio da especialidade determina que a lei mais específica sobre o tráfico de drogas deve ser aplicada, e o crime de associação criminosa (que é mais genérico) não será punido se já for punido o tráfico.

Exemplo Prático

- Exemplo 1 - Crimes de homicídio e homicídio qualificado:

- O homicídio simples (art. 121 do Código Penal) é uma norma geral, enquanto o homicídio qualificado (art. 121, § 2º, do Código Penal) é uma norma mais específica, que descreve de forma detalhada os homicídios cometidos com circunstâncias qualificadoras (como motivo torpe, fútil, etc.). Se alguém comete um homicídio e ele se enquadrar na qualificadora, será punido pela norma mais específica, ou seja, a de homicídio qualificado, e não pela de homicídio simples.

- Exemplo 2 - Crimes de roubo e furto:

- O crime de furto (art. 155 do Código Penal) é uma norma geral, enquanto o roubo (art. 157 do Código Penal) é uma norma mais específica, pois o roubo envolve, além do ato de subtrair, o uso de violência ou grave ameaça. Portanto, se uma pessoa comete o furto, mas utiliza violência ou ameaça no ato, o crime será enquadrado como roubo, devido ao critério da especialidade.

Importância do Princípio da Especialidade

1. Adequação da Punição: Ao aplicar a norma mais específica, o direito penal garante que o agente seja punido de acordo com a gravidade de sua conduta, já que a norma específica reflete de forma mais precisa o comportamento ilícito e a lesão ao bem jurídico.

2. Segurança Jurídica: Esse princípio oferece maior clareza e previsibilidade sobre qual norma será aplicada em casos de conflito entre normas penais.

3. Racionalidade na Aplicação da Lei Penal: O princípio da especialidade evita que o réu seja punido de maneira exagerada ou desproporcional ao fato praticado, pois ele é mais justamente enquadrado na norma mais precisa para sua conduta.

Diferença entre o Princípio da Especialidade e o Princípio da Subsidiariedade

É importante distinguir o princípio da especialidade do princípio da subsidiariedade, que também se aplica em situações de conflito de normas penais:

- Princípio da Subsidiariedade: Quando a norma mais genérica não for suficiente para punir o agente, aplica-se a norma mais grave e específica. A subsidiariedade é usada para suplementar a norma genérica em casos em que ela é insuficiente para descrever adequadamente a conduta criminosa.

- Princípio da Especialidade: Aplica-se quando há uma norma penal mais específica e uma norma mais genérica para o mesmo fato. Nesse caso, aplica-se a norma específica.

Conclusão

O princípio da especialidade é um dos critérios usados no direito penal para decidir qual norma deve ser aplicada quando há conflito entre normas penais. Ele favorece a norma mais específica sobre a mais genérica, garantindo que o réu seja punido de acordo com a natureza exata de sua conduta, levando em consideração a gravidade do crime e a adequação da pena. Esse princípio assegura uma aplicação mais justa e racional das normas penais, com foco na precisão na tipificação do crime.


No direito penal, o conceito de leis concorrentes e o princípio "lex posterior derogat priori" envolvem a análise de sucessão temporal de leis, ou seja, a situação em que uma nova lei penal entra em vigor e pode afetar a aplicação de uma norma anterior. A expressão "lex posterior derogat priori" significa que a lei posterior revoga ou modifica a lei anterior, criando uma nova ordem normativa. Esse princípio é aplicado quando duas ou mais leis têm o mesmo objeto ou regulam a mesma matéria, mas a nova lei, ao entrar em vigor, altera o tratamento jurídico da situação.

1. Leis Concorrentes e Sucessão Temporal

Leis concorrentes são aquelas que regulam o mesmo fato ou a mesma conduta, mas de maneira distinta, ou seja, podem ser aplicadas para tratar da mesma questão, mas com diferentes abordagens, prazos ou punições. Esse conceito é particularmente relevante quando há sucessão temporal de normas, ou seja, quando uma norma nova substitui ou altera a norma anterior.

Quando se fala de sucessão temporal, trata-se da entrada em vigor de uma nova norma que pode modificar a aplicação da lei anterior. Esse fenômeno é regulado pelo princípio "lex posterior derogat priori", que, no contexto do direito penal, significa que:

- A lei posterior revoga ou modifica a lei anterior quando entram em conflito.

- A nova lei (posterior) se sobrepõe à lei anterior (prior), ou seja, ela pode revogar ou modificar a norma anterior.

Esse princípio se aplica principalmente quando as duas leis regulam a mesma matéria e há uma mudança no tratamento da conduta ou na pena prevista para o mesmo crime. Assim, em situações de sucessão temporal de normas, a lei posterior prevalecerá, exceto se houver uma norma que expressamente diga o contrário.

2. Princípio Lex Posterior Derogat Priori

A expressão "lex posterior derogat priori" significa "a lei posterior revoga a anterior". Este princípio é central para entender a sucessão de normas no direito penal, pois ele estabelece que a nova lei (posterior) deve prevalecer sobre a lei anterior (prior). No entanto, esse princípio tem algumas nuances que precisam ser observadas:

- Lex posterior: A nova lei que entra em vigor depois de uma outra, criando um novo regime jurídico.

- Lex priori: A lei antiga, que estava em vigor antes da nova lei e que é substituída ou modificada pela lei posterior.

Aplicação no Direito Penal:

- Quando uma nova lei penal entra em vigor, revoga a anterior em casos de conflito de normas. Ou seja, a norma mais recente substitui a norma mais antiga em relação a um mesmo fato.

- A regra geral é que a lei penal mais benéfica ao réu deve ser aplicada, mas se uma nova lei é mais severa, a lex posterior não poderá retroagir, sendo aplicada apenas para fatos ocorridos após sua vigência.

Exemplo: Suponha que uma lei de 2001 estabeleça uma pena para um crime, e em 2010 uma nova lei altere a pena desse mesmo crime, agravando-a. A lei de 2010 prevalecerá sobre a de 2001, já que a nova lei revoga a anterior, conforme o princípio lex posterior derogat priori.

3. Exceções ao Princípio Lex Posterior Derogat Priori

O princípio "lex posterior derogat priori" pode ser modificado ou suprimido em algumas situações, como nos seguintes casos:

a. Lei mais benéfica ao réu

- O princípio da retroatividade benéfica (previsto no art. 5º, inciso XL, da Constituição Federal) pode permitir a aplicação da lei posterior mais benéfica ao réu, mesmo que o crime tenha sido cometido antes da nova lei.

- Exemplo: Se uma pessoa comete um crime em 2005 e, em 2008, uma nova lei penal entra em vigor reduzindo a pena para esse crime, a nova lei poderá ser aplicada retroativamente para beneficiar o réu, pois a lex posterior é mais benéfica.

b. Lei que revoga expressamente outra

- Em algumas situações, a nova lei pode revogar expressamente a anterior, ou seja, uma lei posterior pode indicar explicitamente que ela substitui a anterior. Quando isso acontece, a lex posterior se sobrepõe de forma absoluta.

c. Leis excepcionais ou temporárias

- Leis temporárias ou excepcionais podem ser criadas para situações específicas e, ao expirarem, a lei anterior volta a ser válida. Nesse caso, a lex posterior não prevalece permanentemente.


4. Exemplo Real de Lex Posterior Derogat Priori no Brasil

Um exemplo típico de sucessão temporal de normas e a aplicação do princípio "lex posterior derogat priori" no Brasil ocorreu com a Lei 8.072/1990 (Lei dos Crimes Hediondos) e a Lei 13.964/2019 (Pacote Anticrime).

- Lei 8.072/1990 (Lei dos Crimes Hediondos): Estabeleceu, entre outras coisas, que os crimes hediondos seriam sujeitos a um regime de cumprimento de pena mais severo e restrito, como a proibição de liberdade condicional.

- Lei 13.964/2019 (Pacote Anticrime): Alterou várias disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal, incluindo a progressão de regime para crimes hediondos. A nova lei modificou a forma de cumprimento das penas para certos crimes, como a possibilidade de progressão de regime antes do cumprimento integral da pena mínima.

Neste caso, a Lei 13.964/2019 tem um efeito de revogação em relação a algumas disposições da Lei 8.072/1990, especialmente no que diz respeito à progressão de regime, pois a nova lei revogou parcialmente a restrição da progressão de regime para crimes hediondos, o que configura uma lex posterior derogat priori.


Conclusão

O princípio "lex posterior derogat priori" é essencial para entender a sucessão temporal de leis penais, garantindo que, em caso de conflito entre leis, a nova lei (posterior) se sobreponha à lei anterior (prior). No entanto, há exceções importantes, como o tratamento de leis mais benéficas ao réu. Esse princípio assegura que o direito penal se ajuste com o tempo, refletindo as mudanças na política criminal e nas necessidades sociais, com a nova norma sendo aplicada aos casos futuros ou, em algumas situações, aos fatos passados, quando for mais favorável ao réu.


Prazo e termo.

Art. 10, CP => diferente=> art. 798, § 1º, CPP.

onsequências jurídico-penais condicionadas ao tempo.(#)

Calendário.

Frações não computáveis da pena: art. 11, CP.

Legislação especial: art. 12, CP=> especialidade.

eis concorrentes: verificar => sucessão temporal=> lex posterior derogat priori.(#)

onflito de leis penais no tempo.(#)

oncursos de crimes.(#)

CONFLITO OU CONCURSO APARENTE DE NORMAS

RINCÍPIO ou CRITÉRIO DA ESPECIALIDADE(#)

lei especial derroga a lei geral: lex specialis derogat generali.(#)

Norma geral

Norma especial

PRINCÍPIO ou CRITÉRIO DA SUBSIDIARIEDADE

A lei principal (primária) derroga a lei subsidiária: lex primaria derogat legi subsidiariae.

Norma primária (principal)

Norma subsidiária (famulativa)

SUBSIDIARIEDADE EXPRESSA

• SUBSIDIARIEDADE IMPLÍCITA OU TÁCITA

PRINCÍPIO ou CRITÉRIO DA CONSUNÇÃO (OU ABSORÇÃO)

A lei consuntiva derroga a lei consumida: lex consumens derogat legi consumptae.

HOMICÍDIO

TENTATIVA DE HOMICÍDIO

LESÃO

• CRIME PROGRESSIVO

• PROGRESSÃO CRIMINOSA

• ANTEFATO IMPUNÍVEL

• PÓS-FATO IMPUNÍVEL

OBS=> CRIME COMPLEXO=> a.a.: subsidiariedade ou especialidade; a.a.: subsidiariedade implícita ou consunção.

PRINCÍPIO ou CRITÉRIO DA ALTERNATIVIDADE